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Blues and jeans

  • Livia Guimarães
  • 7 de set. de 2016
  • 2 min de leitura

Sou um pássaro voando por essas estradas do sul, com meu violão no banco e bolsos cheios de dúvidas, voando, voando pra longe.

Decidi atravessar a fronteira e não faço a mínima ideia do que me espera do outro lado. Minha fé está abalada mas mesmo assim, sigo o sol preguiçoso.

Sabe, ser livre não é escolher um novo rumo a cada nascer do sol. Ser livre é poder desfazer os laços que te impedem de chegar aonde se quer. Por isso coloquei o pé na estrada. Não serei o último e nem o primeiro a buscar aquela estreita linha do horizonte na qual o céu encontra a terra.


Parei em um desses cafés empoeirados e escondidos do lado Oeste, precisava de uma dose de cafeína. Sentei em uma mesa qualquer e pedi uns donuts. E enquanto tirava um maço de Derby vermelho do bolso foi que eu a vi, usava uma jaqueta jeans.


Ela esperou alguns minutos até receber seu expresso, encostou a ponta do nariz e respirou fundo, como se medisse a qualidade da bebida pelo aroma. Deixou uma nota embaixo de um porta-guardanapos e saiu apressada.

Suas tatuagens surgiram enquanto erguia o copo, mostrando um pouco a pele. O que despertou minha curiosidade em saber o por que da constelação de escorpião no antebraço direito.


Não pretendo ficar mais do que duas noites por essas bandas, sabe como é, já vivi o suficiente para saber que, quando a estrada é longa a tendência é perder a coragem.

...


O café a noite se transforma em bar, enchendo de pessoas em busca de doses baratas de álcool e distrações. Pelo menos me rende alguns bons trocados.

Como o bar tinha acabado de abrir, comecei a passar o som e entrei em transe enquanto solfejava uma canção do Bill Monroe.

O Bluegrass é pra mim tão vital quanto respirar. Está nas minhas origens e na tradição do Alabama,

Todo mundo foi embora

Fizeram as malas e seguiram em frente

Eu estou economizando garota

Para fazer uma viagem para o Novo México

Ouvi dizer que é o lugar para se ir

Quando quiser ver as cores de um outro céu

Mas desde que a vi não penso em ir sem você

Por isso ainda estou aqui, preso

Só tenho meus dentes brancos e meu jeans rasgado

Meu cabelo longo e o meu violão

Mas diga que vem comigo a Santa Fé

Oh chame-me de manhã depois do seu café

Não sei bem a quantos minutos seus olhos inocentemente selvagens estavam ali me fitando, notei que ela tinha trocado o café por uma cerveja, mas ainda vestia a jaqueta jeans.

Levantou a garrafa ao ar como em parabenização pela canção, bebeu um gole da garrafa e saiu.


No dia seguinte eu a vi novamente. Como um dia repetido ela pediu um expresso, sentiu o aroma da bebida e colocou o dinheiro embaixo do porta-guardanapos, mas dessa vez não foi embora apressada.

Puxou uma cadeira, sentou-se a minha mesa, e juntos conversamos sobre blues e constelações.

Na terra dos esquecidos, alguns corações ainda são jovens.

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"FUI PARA OS BOSQUES VIVER DE LIVRE VONTADE. PARA SUGAR TODO O TUTANO DA VIDA. PARA  ANIQUILAR TUDO O QUE NÃO ERA VIDA E PARA QUANDO MORRER, NÃO DESCOBRIR QUE NÃO VIVI."

Henry David Thoreau

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